segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Senhora do mundo e do Velho Chico

Fiz referência anteontem a Joana Camandaroba, a propósito da biografia de Deocleciano Martins de Oliveira. Hoje a professora ocupa o centro do palco, sendo ela própria, aos 95 anos de idade, uma referência do médio São Francisco.

Nasceu na pequeníssima Utinga, entre Xique-Xique e Barra. Sua mãe grávida havia feito a promessa de participar da roda de São Gonçalo, na véspera do dia de São João, para que seu parto fosse bem sucedido. A professora Joana esclarece: “A dança de São Gonçalo é a derradeira dança como oferenda litúrgica que possuímos. Na Bahia setecentista, dançava-se em plena missa. Por ser irreverente e supersticiosa, a dança mudou-se para o interior. Não se dança por distração, dança-se por promessa.”

Deu certo. Ainda enquanto dançava, na madrugada de 24 de junho de 1914, dia de São João, d. Maria de Morais sentiu as dores do parto, indo de imediato para casa para que nascesse em paz a menina.

Joana conheceu o mundo inteiro. Patrocinada pelo pai, Antônio Luis Camandaroba, que enriqueceu no negócio da carnaúba, viajou pelas américas do Sul e do Norte, passou pela Europa, tendo se encontrado em audiência com o papa Pio XII, visitou o oriente médio e foi até o extremo oriente. Admirou-se com a riqueza das igrejas peruanas, viu as relíquias do Vaticano, os tesouros culturais de Portugal, Espanha, Itália, França, Grécia, Alemanha, Países Baixos e Turquia, aproximou-se da esfinge e das pirâmides do Egito e deslumbrou-se com monumentos no Japão e a magnífica muralha da China. Bebeu da cultura dos quatro cantos da terra, mas nada nesta vida a encanta mais do que a causa da educação.

Depois da escola normal, no Colégio Santa Eufrásia, em Barra, partiu com a irmã Alzira, em 1933, para Formosa do Rio Preto, cidadezinha isolada nos chapadões do oeste baiano. Foram sete dias de viagem a cavalo entre buritizais, dormindo ao relento, sob as estrelas. A viagem de volta, descendo o rio de balsa, alguns anos mais tarde, foi outra aventura que não esquece. Transferiram-se – ela e a irmã - para Pilão Arcado, graças à intervenção do lendário Coronel Franklin, onde permaneceu por dois anos. Alzira casou-se e lá ficou, Joana pegou o caminho de Santa Rita de Cássia, às margens do Rio Preto como Formosa. Em 1940, partiu para Barreiras, à beira do Rio Grande.

A professora relembra com saudade de Barreiras: “Era o tempo de Geraldo Rocha, Antônio Vieira de Melo (pai), Alfredo Jacobina, Orlando Rocha, Sabino Dourado, Leovegildo Figueiredo, Abelardo Alencar, Aníbal Barbosa, João de Oliveira, sem falar em Antônio Balbino de Carvalho, ministro de Estado de Getúlio Vargas, Tacilo Vieira de Melo, líder do governo Juscelino Kubitschek”.

Em 1945, voltou à Barra, onde consolidou sua obra de educadora e benfeitora dos necessitados e lá vive até hoje.

A história é longa e cheia de peripécias, merecendo uma biografia volumosa, mas vou parar por aqui. A professora Joana publicou um delicioso relato de sua vida sob o título “Memórias da Dinda”, prefaciado por Wilson Lins, o renomado escritor de Pilão Arcado, entretanto acho que é pouco, é preciso entrar mais nos detalhes e contar outras histórias. Ela merece.

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