terça-feira, 2 de março de 2010

Tardes sanfranciscanas

Era bom apoiar os cotovelos na balaustrada do cais da Barra, à sombra de uma mangubeira qualquer, e olhar para o rio São Francisco. Lá vinha ele com sua água barrenta, descendo e passando solene à nossa frente. Parecia ignorar o pobre rio Grande que chegava dos lados de Goiás com sua água límpida tentando se aconchegar no caudal poderoso que descia de Minas. Era como se o orgulhoso São Chico dissesse: “Não me misturo com qualquer um.” Birra besta e passageira, e a prova disso é que logo abaixo da cidade da Barra os dois se abraçavam e se fundiam num casamento perfeito, como se nada tivesse acontecido.

Eu gostava de ver a chegada e a partida das barcas e fofa-barrancos, que levantavam maretas, balançando as canoas atracadas na margem, e assustavam os passsarinhos. Melhor ainda era quando um grito malandro agitava a tarde, acabando com o longo silêncio da sesta e catalisando a animação na velha praça do mercado.

Tardes quentes e divertidas, repletas de gaiatice. Os doidos, os simples e os brejeiros eram alvos preferenciais dos gaiatos do cais, com sua capacidade infinita de criar apelidos hilariantes. Os bêbados assumiam, às vezes, o protagonismo do divertimento vespertino. As moças educadas que estudavam no colégio das freiras mudavam de caminho, os homens respeitáveis observavam carrancudos à distância e as senhoras mais velhas nem se aventuravam a andar por aquelas quebradas bravias. A praça e o jardim adjacente ficavam entregues à turba insana e irreverente.

Aquelas tardes ociosas, vadias e inúteis até hoje me sustentam.

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